Faz hoje dezasseis anos que comecei a escrever em público sobre design no meu blogue ressabiator. Fiz assim parte da primeira vaga de escrita online sobre design que haveria de caracterizar a primeira década desde século. Não o assinalo por nostalgia ou para me pôr em bicos dos pés. Quando comecei só queria uma plataforma para escrever, porque não havia nem periódicos sobre design ou sequer colunas regulares sobre design nos jornais e revistas generalistas.
Escrevi-o numa época onde a escrita e a discussão sobre design se tinham tornado instantâneos. Até ao fim da década de 1990, os debates públicos dentro do design gráfico eram de tal forma lentos e espaçados que se tornavam em eventos com a aura mística de um combate de boxe entre semi-deuses: Jan Tschichold vs. Max Bill, Jan van Toorn vs. Wim Crouwel, as Guerras da Legibilidade, etc.
É bem possível que a imagem gráfica que nos vai ficar desta epidemia do Covid-19 seja esta, a de duas curvas sobrepostas, uma elevando-se alta e estreita, a outra longa e achatada. A primeira curva ilustra a progressão livre do contágio, manifestando-se num pico de casos que ultrapassa os recursos do sistema de saúde. A segunda mostra como, através do isolamento social e da quarentena auto-imposta, se pode retardar a evolução da epidemia de modo a que as ocorrências se espalhem ao longo do tempo, mantendo-se abaixo das capacidades do sistema saúde. Em suma: ilustra, de modo simples, directo e eficaz, duas alternativas, duas estratégias, argumentando a favor de uma delas.
Com o fecho da faculdade por causa do Covid-19, tenho adiantado leituras (lista no fim do artigo).
Revisito o design de há uma década e meia. Penso no que será uma história específica do design, entendida não como uma história definida pelos objectos, instituições e praticantes do design, mas uma história com uma forma ou formas que se possam identificar.
Pergunto se há tendências, estilos ou movimentos dentro da história do design. Se é possível, por outras palavras, fazer uma história da história do design – tirando este post, ainda não escrevi nada.
Investigação sobre um assassinato por drone em Miranshah, no Waziristão do Norte.
A 12 de Fevereiro deste ano, o departamento de Homeland Security dos Estados Unidos da América classificou o arquitecto britânico de origem Israelita Eyal Weizman como um risco para a segurança do país. O seu visto de entrada foi revogado, impedindo-o de viajar para a Florida, onde estava a ser montada uma retrospectiva do colectivo que fundou, os Forensic Architecture. Quando pediu um novo visto na embaixada norte-americana em Londres, foi informado que um algoritmo o tinha identificado como ameaça. É provável que um cruzamento entre as viagens que fez, os locais que visitou e as pessoas e organizações com quem contactou tenha desencadeado a decisão.
Criados em 2010, como um núcleo de investigação da Goldsmiths (Universidade de Londres), os Forensic Architecture especializam-se na criação de técnicas experimentais para investigar crimes de guerra, em grande medida baseando-se em métodos e tecnologias de projecto oriundas da arquitectura. O colectivo inclui arquitectos, artistas, cineastas, jornalistas, cientistas e advogados.☀︎ Já abordaram casos relacionados com a crise de refugiados no Mediterrâneo, com a ocupação dos territórios Palestinianos, com a tortura de prisioneiros pelo regime de Bashar Al-Assad na Síria, com a investigação de crimes sobre populações civis no Guatemala. Em menos de uma década, o seu trabalho foi apresentado perante tribunais penais internacionais e na Assembleia Geral da ONU. Figurou também em exposições e bienais de arte, arquitectura e design, a mais notória sendo a Whitney Biennial de 2019, onde apresentaram provas de que a empresa Sierra Bullets, em parte propriedade de Warren Kanders, vice-presidente da bienal, tinha fornecido munições à Israeli Defense Force (IDF) usadas contra acções de protesto na faixa de Gaza, constituindo um provável crime de guerra.
Era este percurso que um algoritmo tinha classificado como ameaçador. As movimentações e a rede de contactos de um investigador é, evidentemente, bastante semelhante à de quem investiga – do lado da recolha bruta de dados, confundem-se vítimas, criminosos e investigadores. A própria condição de vítima é com frequência obscurecida de modo tático. A vítima civil de um acto de guerra ilegal é, por exemplo, apresentada pelo agressor como um terrorista. A revogação do visto de Weizman constitui um exemplo de obscurecimento tático, onde a própria decisão é remetida para a instância inumana representada pelo algoritmo, cujos critérios ou procedimento não são públicos.
Uma das investigações dos Forensic Architecture focou-se na campanha norte-americana de assassinatos de guerrilheiros Talibã através de drones na fronteira paquistanesa com o Afeganistão entre 2004 e 2014. Parte da ofensiva foi feita em segredo, recorrendo a mísseis concebidos com o objectivo de assassinar pessoas dentro de edifícios sem afectar a estrutura destes. Os projécteis entram pelo telhado e têm uma detonação temporizada de maneira a explodir num andar específico. O furo de entrada tem uma dimensão que passa despercebida nas imagens recolhidas por satélite – o que, associado a uma proibição de recolha de imagens na zona, dificulta a investigação destes ataques, necessariamente feita à distância, dadas as restrições de circulação.
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